Os últimos acidentes registrados nas ciclofaixas de Balneário Camboriú evidenciaram as dificuldades enfrentadas pelos usuários dessas vias, devido à ausência de legislação específica, regras e fiscalização. Essa lacuna resulta em uma situação caótica e sem controle, caracterizada pelo princípio do “cada um por si”.
Entre as principais queixas dos usuários das ciclofaixas estão a presença de veículos de aluguel, como patinetes, ciclomotores e bicicletas, a falta de manutenção das vias, com buracos não reparados, e ônibus que desrespeitam os locais de parada designados. Além disso, há preocupações com a reurbanização da orla, que não inclui planos para a criação de novas faixas dedicadas à micromobilidade.
Ciclofaixas de Balneário Camboriú
Balneário Camboriú conta com aproximadamente 46km de malha cicloviária, organizada em ciclofaixas de mão dupla, destinando uma faixa para cada sentido de tráfego.
As ciclofaixas que frequentemente são cenário de acidentes incluem as da Avenida Atlântica, Avenida Normando Tedesco e Estrada da Rainha. Estas vias são não apenas meios de transporte para os moradores, mas também pontos de lazer e prática esportiva tanto para a população local quanto para turistas.
Acidente Fatal
Ao longo dos anos, diversos acidentes foram registrados nas ciclofaixas, com o mais grave sendo o que custou a vida de um jovem bombeiro. Em 2021, a ciclofaixa da Estrada da Rainha foi palco de um trágico acidente envolvendo uma bicicleta e um ciclomotor. O incidente ocorreu no dia 15 de julho, por volta das 18h, quando Jefferson Lopes, de 29 anos, Bombeiro Militar lotado na OBM de Rio do Sul, descia o Morro da Rainha em direção à Praia Brava e colidiu com uma scooter.
O soldado Jefferson Fonseca Lopes teve morte cerebral declarada no dia 10 de julho, após quase um mês de internação. Naquele período, o trânsito de ciclomotores nas ciclofaixas era proibido por decreto municipal; contudo, medidas efetivas quanto à fiscalização e prevenção de acidentes semelhantes não foram reportadas.
Acidentes em 2024
No início de março de 2024, a ciclofaixa da Avenida Atlântica ganhou destaque nacional após um vídeo de um acidente envolvendo um patinador e um usuário de patinete elétrico de aluguel viralizar. O grave incidente, ocorrido em um sábado, 9 de março, à tarde, por volta das 15h, na ciclofaixa da Avenida Atlântica, onde um patinador empurrou um usuário de patinete elétrico, se tornou um caso policial devido à sua severidade. O acidente, capturado por uma transmissão ao vivo no YouTube, resultou em sérias lesões para a vítima, que sofreu a quebra de sete costelas e de uma vértebra torácica, além de um derrame pleural, com acúmulo de líquido nos pulmões. A Polícia Civil está tratando o caso como tentativa de homicídio com dolo eventual.
Em um episódio similar ocorrido menos de uma semana depois, na quinta-feira, 14 de março, outro acidente foi registrado, desta vez na ciclofaixa da Avenida Normando Tedesco, próximo à rua 3900, na Barra Sul. A vítima, um morador local que preferiu não se identificar, relatou ter sido surpreendido por um patinete de aluguel ocupado por duas pessoas enquanto transitava pela ciclofaixa. “Saí de casa na Barra Norte pela ciclovia da Atlântica, percorri até o final na Barra Sul e segui até o término da ciclovia da Normando Tedesco, próximo à rua 3700. Já estava retornando quando, na primeira curva, me deparei com três patinetes de aluguel, esses azuis que se veem pela cidade, vindo em sentido contrário com quatro ou cinco pessoas. Ao me aproximar para cruzar com eles, um dos patinetes, que levava um casal, invadiu minha faixa, colidindo frontalmente comigo. Eles caíram na faixa destinada aos carros, minha bicicleta atingiu o meio-fio e eu fui lançado para a calçada.”
A vítima expressou preocupação com a frequente insegurança nas ciclofaixas da cidade, atribuindo parte do problema à falta de fiscalização. “Como morador que usa regularmente a ciclovia para recreação, estou cansado de ver pessoas, seja de bicicleta ou patinete, tentando andar em dupla, lado a lado, ocupando ambas as faixas. Outro problema são os grandes ciclomotores elétricos, que, embora proibidos, continuam circulando livremente pela ciclovia,” relata.
Uma testemunha ocular do acidente, Thiago Generali, corroborou a versão da vítima, apontando a responsabilidade para o usuário do patinete. “Eu vi o acidente. A culpa foi totalmente do cara do patinete. Estavam em três, de patinete, agindo de forma irresponsável,” conta.
Na esteira dos relatos de acidentes, um morador local, Ésler Ferron, contatou nossa redação para compartilhar sua própria experiência traumática. O acidente, que quase o deixou paraplégico, ocorreu na ciclofaixa da Avenida Atlântica, em 6 de fevereiro de 2024, por volta das 11h30, na altura da rua 4100, em frente ao Costão da Barra. “Eu estava de patinete a caminho da minha loja, quando dois turistas, competindo em bicicletas da FG, colidiram de frente comigo enquanto ultrapassavam um ao outro na contramão, lançando-me para o meio da avenida Atlântica,” relata Ferron.
Ferron descreveu a falta de apoio e atenção das autoridades de segurança após o acidente. “O socorro chegou, mas até hoje não sei o nome dos responsáveis pelo acidente. A Guarda Municipal não deu a devida importância. Não se prestaram a oferecer assistência adequada, mandando esperar pelo SAMU. Fui imobilizado e levado à Unimed, enquanto os causadores do acidente seguiram suas vidas como se nada tivesse acontecido.”
Ele também compartilhou a gravidade de suas lesões: “Estou com três vértebras da coluna fraturadas. Por apenas 10mm, não fiquei paraplégico.“
“Sou morador e utilizo a ciclofaixa há 4 anos. É evidente que a infraestrutura atual não suporta as bicicletas da FG, os patinetes da Pulga, e agora, os JETs. Há uma clara falta de estrutura, regulamentação e operações adequadas para atender a essa demanda. Embora a mobilidade seja benéfica para a cidade e para as pessoas, muitos turistas ficam maravilhados com o serviço e agem de maneira imprudente, colocando em risco suas próprias vidas e a de outros,” desabafou a vítima.
Na última semana, os bombeiros responderam a três chamados em ciclofaixas da Atlântica e da Rainha. No dia 18 de março, por volta das 20h50, foram acionados para uma queda de bicicleta na Avenida Atlântica. Ao chegar, confirmaram a ocorrência envolvendo E.L.R., de 45 anos, que estava consciente e orientado, com sinais vitais normais, sentado, relatando dor no cotovelo esquerdo, mas sem lesões adicionais, cervicalgia, sinais evidentes de TCE, comorbidades ou alergias conhecidas. Após atendimento inicial, o homem foi encaminhado ao Hospital Municipal Ruth Cardoso.
Na quinta-feira, 21, atenderam a mais duas ocorrências nas ciclofaixas. A primeira, às 18h30 na Avenida Atlântica, envolveu M.C.V., de 64 anos, que foi atropelada por um patinete elétrico enquanto estava na ciclofaixa. Encontrada em decúbito dorsal, a idosa apresentava escoriações leves e foi avaliada e liberada no local sem lesões graves aparentes.
Por volta das 19h, um novo chamado levou os bombeiros à Ciclofaixa da Estrada da Rainha para um atropelamento de pedestre por um ciclista. L.S.A, de 35 anos, foi a vítima encontrada consciente e orientada, com lesão facial e um ferimento no membro inferior esquerdo. Após estabilização, foi transportada de ambulância ao pronto socorro.
A ciclofaixa da Avenida Atlântica
A ciclofaixa da Avenida Atlântica, inaugurada em dezembro de 2013, estende-se por quase seis quilômetros ao longo da orla marítima. A obra, que custou aproximadamente R$350 mil, foi projetada para o uso compartilhado por bicicletas e skates, apresentando uma largura variável entre dois e três metros em certos trechos da avenida.
Com sua inauguração em 2014, a ciclofaixa rapidamente tornou-se motivo de polêmica na cidade, devido à ausência de regras claras e ao registro de acidentes. Em 18 de janeiro de 2014, um incidente emblemático envolveu a colisão entre um skatista e um ciclista, resultando em fratura na perna do primeiro. Naquela época, a ciclofaixa foi apelidada pejorativamente de “ciclocoisa” e sofreu uma avalanche de críticas nas redes sociais.
Bruno Leonardo da Silva, expressando sua insatisfação, comentou: “O lugar mais perigoso em que já andei de bicicleta foi essa ‘ciclovia’. Quando ela não existia, eu andava ao lado dos carros e não precisava desviar de nada.”
Maurício dos Santos, por sua vez, questionou a eficácia da ciclofaixa com uma crítica ácida: “Esta CICLONADA (algo que tenta abranger tudo, mas acaba não abrangendo nada) coloca em risco todos nós. É essa a Ciclovia da Atlântica que tanto queríamos?”
Ciclofaixa ultrapassada?
Uma década após sua inauguração, a ciclofaixa da Avenida Atlântica parece ter ficado para trás em relação às necessidades atuais de Balneário Camboriú. Apesar do significativo crescimento da população da cidade, que aumentou mais de 28% na última década de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), e do expressivo acréscimo no número de turistas — com mais de 1,5 milhão de visitantes recebidos apenas neste verão — as mudanças na forma de locomoção e na mentalidade das pessoas não foram acompanhadas por melhorias equivalentes na infraestrutura da ciclofaixa. A via permanece com o mesmo tamanho, sem a implementação de regras claras, fiscalização adequada e agora enfrenta o desafio adicional trazido pela popularização de veículos elétricos.
Originalmente projetada para acomodar bicicletas e, no máximo, alguns skates e patinetes de propulsão humana, a ciclofaixa agora precisa dividir seu espaço limitado com uma variedade de usuários de veículos elétricos, incluindo bicicletas elétricas, patinetes elétricos e ciclomotores. Este cenário amplia as questões de segurança e eficiência, colocando em evidência a necessidade premente de revisão e atualização da infraestrutura para atender à realidade contemporânea da mobilidade urbana em Balneário Camboriú.
As principais reclamações dos moradores de Balneário Camboriú concentram-se nos patinetes elétricos e ciclomotores, com ênfase no comportamento imprudente de alguns usuários.
Davi Lopes destaca a atitude irresponsável de certos condutores que pilotam seus veículos elétricos como se estivessem em motocicletas, desconsiderando o propósito da ciclovia destinada a ciclistas e pedestres. “Querem andar com esses patinetes e motinhas como se estivessem em uma moto de verdade, em uma via que é para ciclistas e pedestres, o que é problemático. Na Avenida Atlântica, há placas informando a proibição de ciclomotores na ciclovia, mas a regra é frequentemente ignorada por muitos,” acrescenta.
Camila Cordova Zanella relata a problemática invasão de faixas, que resulta em acidentes. “Eu costumo andar de bicicleta na Atlântica e, constantemente, tenho que desviar dos patinetes que invadem a pista contrária,” afirma.
A falta de respeito nas faixas de pedestres é outro ponto crítico, conforme descreve Kaká Oliveira, morador da Avenida Central. “Os patinetes elétricos frequentemente ignoram os semáforos. Muitas vezes, sou forçado a correr, carregando meu cachorro no colo, mesmo com o sinal fechado, pois eles não respeitam a sinalização. Por diversas vezes, quase fui atropelado por eles! Balneário precisa adotar medidas urgentes em relação a esses patinetes,” relata.
As imprudências na ciclofaixa de Balneário Camboriú não se limitam aos veículos elétricos. Usuários da via expressam insatisfação com a diversidade de atividades e veículos permitidos, incluindo bicicletas, patins, skates, além da prática de corrida e pontos de parada de ônibus. “Essa ciclovia é um absurdo, tem de tudo. Desde motorizados até pessoas correndo. Menores dirigindo motorizados”, critica Rose Vizoni.
A falta de conhecimento ou desrespeito às regras de trânsito também é uma fonte de reclamações. Pedestres que invadem a ciclofaixa e ciclistas que cruzam faixas de pedestre sem desmontar das bicicletas são comportamentos comuns. “Não são só os patineteiros que andam na contramão e em alta velocidade; ciclistas fazem o mesmo, além de carros que se consideram donos das ruas e pedestres que atravessam sem olhar ou quando o sinal está verde. Balneário Camboriú já foi muito melhor, mas agora está cheia de gente mal educada e sem noção”, lamenta Jordana Kretzchman.
Samantha, frequentadora assídua da ciclofaixa, compartilha seu crescente medo de usar a via. “Transito todos os dias de bicicleta pela ciclovia, e a cada dia fica mais perigoso. As leis de trânsito não se aplicam aos patinetes. Além disso, a ciclovia virou uma bagunça, com carros de Uber estacionando para desembarcar passageiros, vendedores ambulantes bloqueando a via com carrinhos de roupas para atender turistas, motos elétricas que são cada vez maiores e mais rápidas ocupando o espaço como se fosse só deles, sem contar as crianças e adolescentes que demonstram zero educação e respeito pelos demais usuários da via”, relata.
A falta de empatia e respeito entre usuários da ciclofaixa é um problema recorrente, como exemplificado por Helio Pereira: “Estava andando de bike na ciclofaixa da Avenida Atlântica e havia um casal parado bem no meio. Quando pedi para que se movessem para a calçada, fui xingado e ainda me desafiaram a ‘passar por cima, se é que você comprou a ciclofaixa'”, relata.
Wanderson Milhomem, um ciclista que registra seus percursos pela cidade e cria conteúdo para conscientizar sobre o uso correto das ciclofaixas, denomina a situação de “Ciclocaos”. Entre os principais problemas observados estão ciclistas empinando bicicletas nas ciclofaixas, pedestres atravessando a rua fora da faixa e invadindo a via sem precaução, além de um incidente de uma moça de patinete que quase atropelou uma idosa desembarcando do transporte coletivo. Esse incidente destaca a falta de conhecimento sobre a convivência segura nas áreas de desembarque de ônibus. Recebemos também relatos de que alguns ônibus que fazem o transporte para pontos turísticos da cidade não respeitam as paradas oficiais, parando em qualquer lugar da ciclofaixa e comprometendo a segurança dos desembarques.
Na Estrada da Rainha, o problema se agrava com pessoas que param no meio da ciclofaixa para tirar fotos da cidade, além de veículos que estacionam sobre a pista delimitada de vermelho na descida em direção a Itajaí, obstruindo completamente a passagem e colocando em risco a segurança de quem utiliza a via corretamente.
As reclamações relacionadas ao uso indevido de ciclofaixas e espaços públicos não se limitam aos usuários dessas vias, estendendo-se a pedestres, motociclistas e motoristas. Um exemplo marcante desse problema foi compartilhado por Samantha Cassol, que descreveu uma experiência preocupante vivenciada no deck do Pontal Norte.
Durante o feriado de carnaval, enquanto Samantha e sua família, incluindo uma criança de 6 anos, caminhavam em direção à Praia do Buraco, enfrentaram situações perigosas causadas por um uso irresponsável do espaço. “Por diversas vezes, um casal de adolescentes passou por nós em patinetes, cada um em seu veículo, e em alta velocidade, indo e voltando pelo deck. E, como se não fosse suficiente, um rapaz em uma moto elétrica, equipada com pneu largo e espelhos também largos, transitava pelo deck como se fosse perfeitamente normal”, relatou Samantha. Ela ainda mencionou que um dos adolescentes de patinete quase atropelou sua prima de 6 anos. Quando a família tentou buscar ajuda com a Guarda Municipal para relatar a situação, não encontraram nenhum agente disponível para atender a denúncia.
Sheila Alflen de Matos, motociclista, compartilha as dificuldades encontradas no trânsito da cidade devido à conduta de usuários de patinetes: “Para nós que andamos de moto, está um absurdo. Eles vêm na contramão, se enfiando na frente; você tem que frear rápido para não atropelar ou evitar uma queda. Um total descaso com quem tem habilitação e segue as leis, enquanto essas motos andam até pelas calçadas”.
Jorge Heleno, um motoboy, relata sua experiência nas ruas de Balneário: “Esses patinetes estão fora de controle. Pessoas entram em ruas na contramão e, várias vezes, tive que desviar para não colidir frontalmente, inclusive quando andam em dupla, normalmente com uma criança. Sou motoboy, circulo o dia todo, e é assim todos os dias”.
A problemática dos ciclomotores também é mencionada, destacando-se o uso inadequado nas ruas sem o devido cumprimento das regras de trânsito: “Não são apenas os patinetes; há veículos estilo moto que acham que podem comportar-se como motos de verdade, andando em alta velocidade, sem capacete e zigzagueando pelo trânsito!”, segundo relato de Eco e Wg Entulhos.
As calçadas também são afetadas, moradores reclamam da vulnerabilidade que sofrem ao caminhar: “temos que dividir passeio com ciclista, patinete. Tá sem segurança nenhuma caminhar por BC. São muitos, não tem estrutura pra isso. Tem que fiscalizar. E não se vê um Guarda Municipal pelas calçadas”, desabafa Elisete Saragoça
A moradora Lara Amaral também expressa sua insatisfação: “andam de patinetes nas calças xingando as pessoas pra sair da frente agora as pessoas são obrigadas a sair da calçadas para eles passarem”.
Veículos elétricos de aluguel
A situação na Avenida Atlântica tornou-se ainda mais crítica após a ciclofaixa, já saturada pelo uso intenso tanto para transporte quanto lazer pelos moradores, enfrentar uma superlotação provocada pela introdução de veículos elétricos de aluguel. A concessão de alvarás pela prefeitura para empresas de transporte alternativo exacerbou o problema, não apenas pelo aumento significativo no número desses veículos, mas também pela inclusão de usuários sem a devida experiência, operando patinetes elétricos, ciclomotores e bicicletas sem a necessária supervisão ou fiscalização.
Conforme apontado, a maior parte dos acidentes registrados em 2024 envolveu veículos de aluguel. À medida que esses incidentes começaram a ser noticiados pelo Click Camboriú, usuários da ciclofaixa expressaram suas preocupações com a situação atual.
Entre as queixas mais frequentes estão as relacionadas aos patinetes elétricos de aluguel. Vinicius Brenneisen, um ciclista, relata sua própria experiência: “Na segunda-feira, 11, um patinete azul invadiu minha faixa na ciclovia, colidiu comigo e me derrubou da bicicleta. Conheço outros que passaram pelo mesmo. É urgente que alguma providência seja tomada”.
Eliane Helena Santin, uma moradora, compartilha sua preocupação com a segurança dos pedestres: “Na quinta-feira, 14, quase fui atropelada na calçada por um patinete azul”.
A prática de usar patinetes, veículos originalmente projetados para uso individual, de maneira compartilhada é um aspecto que tem causado surpresa. Uma moradora relata sua experiência: “Saí para pedalar na noite de terça-feira, 19, e vi quatro pais com crianças nos patinetes, o que me deixou indignada. Em qualquer horário na Avenida Atlântica, é comum ver casais dividindo um patinete e pais transportando crianças como se fosse completamente normal. Com esforço, consegui fotografar uma mulher com uma criança no patinete”, compartilha, preferindo manter anonimato.
Outra preocupação manifestada diz respeito ao uso de patinetes por pessoas sob efeito de álcool, uma situação não rara de se observar: “muitos turistas alugam esses patinetes e estão visivelmente alcoolizados, mal conseguindo manter o equilíbrio”, aponta Flavio Magico.
A imprudência e a falta de respeito de alguns usuários dos patinetes também são criticadas, assim como a inadequação da infraestrutura existente: “As pessoas alugam os patinetes mais por diversão do que para locomoção, e agem irresponsavelmente. Além disso, a ciclofaixa é uma vergonha, por ser extremamente estreita e incapaz de acomodar a grande quantidade de usuários na cidade”, comenta Iohana Lobato.
Donos de patinetes que os utilizam como meio de transporte expressam descontentamento com os transtornos causados pelos usuários de aluguel: “Eu uso meu patinete para ir e voltar do trabalho, e frequentemente me deparo com usuários dos patinetes azuis alugados cometendo imprudências na ciclovia”, menciona Danielle Paula De Alencar.
A questão da idade mínima para o aluguel dos patinetes também é motivo de preocupação: “O problema é que pessoas de qualquer idade podem alugar os patinetes, o que resulta em muitos adolescentes utilizando-os de forma imprudente”, observa Ney Alves.
Jane Cezaro relata a falta de cortesia na ciclovia: “Eles não têm um pingo de educação. Você vai pedalar, e eles dominam o espaço, agindo como se a ciclovia fosse exclusivamente deles. E o pior, tem crianças que, aparentemente, não têm nem 15 anos manejando esses veículos”.
Moradores expressam descontentamento com a situação dos patinetes e pedem por regulamentação e fiscalização mais rigorosas por parte da prefeitura: “A maioria dos que usam esses patinetes mal tem habilidade para andar, quanto mais para operar um veículo motorizado. É necessário que haja uma regulamentação”, aponta Rafael De Boni da Silva.
Gisele Silva critica a introdução dos patinetes: “Esses patinetes foram uma das piores adições à cidade. Já tínhamos problemas com os patinetes particulares, que não respeitavam os pedestres. Agora, com acesso facilitado, a situação piorou.”
Júlia Gellu Antunes questiona a permanência dos patinetes: “Quando a prefeitura vai, de uma vez por todas, proibir esses patinetes?”.
Por último, Silvio Cunha destaca a gravidade da situação: “Não há respeito nem cumprimento das leis! É muito perigoso”.
Atualmente, Balneário Camboriú oferece diversos serviços de aluguel de veículos elétricos por meio de aplicativos, destacando-se principalmente:
- FG e GoMoov: Esta parceria resultou na introdução de 50 bicicletas elétricas na cidade em 8 de outubro de 2022, com a promessa de trazer mais 100 bicicletas até julho de 2023. Segundo o site da FG, estas bicicletas podem atingir velocidades de até 23km/h. Na ocasião, foi anunciado que o uso das bicicletas era recomendado para maiores de 18 anos e aconselhava-se o uso de capacete durante o passeio.
- JET: No início de fevereiro de 2024, a empresa disponibilizou 200 patinetes elétricos na cidade. Em uma nota, a JET destacou que os usuários são instruídos sobre o uso correto dos patinetes em Balneário Camboriú. Um trecho da nota esclarece: “Para assegurar a segurança tanto dos usuários quanto dos pedestres, os instrutores orientam sobre as regras de circulação. Nas calçadas, a velocidade máxima permitida para os patinetes é de 6 km/h, para não comprometer a segurança dos pedestres. Em avenidas, os usuários devem dirigir à beira da via, com uma velocidade máxima de 15km/h. Já nas ciclovias, é permitido alcançar até 20km/h”.
Além dos serviços de aluguel por aplicativo mencionados anteriormente, Balneário Camboriú oferece outras opções para quem busca veículos elétricos, sendo um deles o serviço da Pulga Mobi, disponível na cidade desde maio de 2022. A Pulga Mobi recomenda que os usuários circulem com os patinetes nas ciclovias ou na faixa da direita das ruas, orientando para que, nas calçadas, os veículos sejam conduzidos manualmente, empurrados pelo usuário, visando a segurança de todos.
Adicionalmente, várias lojas na cidade disponibilizam o aluguel físico de diversos tipos de veículos, como bicicletas, bicicletas elétricas, ciclomotores, patinetes elétricos e triciclos.
Falta de regras e fiscalização
Desde a implementação das ciclofaixas, particularmente na Avenida Atlântica, a população enfrenta a carência de regulamentações específicas e de uma fiscalização efetiva desses espaços.
No ano de 2019, o prefeito Fabrício Oliveira promulgou o Decreto nº 9.413, visando regulamentar a circulação de patinetes elétricos, ciclomotores, bicicletas elétricas equiparadas a ciclomotores, além das próprias bicicletas elétricas, em ciclovias, ciclofaixas, calçadas e demais vias públicas de Balneário Camboriú.
Esse decreto entrou em vigor em 20 de agosto de 2019, com a prefeitura justificando as novas normas como uma maneira de ampliar a proteção aos usuários desses equipamentos, dada a crescente adoção dos mesmos.
David Queiroz, o Secretário de Segurança Pública naquele momento, detalhou o propósito da medida: “O decreto visa assegurar a segurança de todos que compartilham a ciclovia, permitindo seu uso sem riscos de acidentes. O objetivo não é restringir o uso desses veículos, mas sim promover sua utilização, por serem opções mais sustentáveis e contribuírem para a redução do tráfego de veículos automotores nas vias”.
O Decreto nº 9.413 estabeleceu normas claras para a circulação de patinetes elétricos, bicicletas elétricas e ciclomotores em Balneário Camboriú, detalhando o seguinte:
Patinetes:
- A condução de patinetes, considerados veículos de transporte individual, é permitida somente em ciclofaixas ou ciclovias, com uma velocidade máxima de 20 km/h.
- Na ciclofaixa da Avenida Atlântica, o uso do patinete é proibido entre 8h e 12h nos fins de semana e feriados.
- É vedada a circulação de patinetes pelas calçadas.
Bicicletas elétricas:
- Sua circulação em ciclovias ou ciclofaixas é permitida, desde que o veículo esteja equipado com espelhos, indicador de velocidade, campainha, sinalização noturna (dianteira, traseira e lateral) e pneus em bom estado.
- O uso de capacete é obrigatório para o condutor.
Ciclomotores:
- Considerados veículos de duas rodas com altura superior a 1,2 m, a condução de ciclomotores por indivíduos sem habilitação na categoria A ou sem a Autorização para Conduzir Ciclomotores (ACC) é proibida.
- A circulação de ciclomotores em calçadas, ciclovias e ciclofaixas é proibida, a fim de garantir a segurança dos demais usuários desses espaços.
- Para obter a ACC, o interessado deve atender aos requisitos aplicáveis às categorias de habilitação A, B e C: ter mais de 18 anos, ser alfabetizado e possuir CPF. A solicitação da ACC deve ser realizada na sede do Detran, localizada na Avenida do Estado, 4243.
Em 19 de outubro de 2021, o Decreto nº 9.413 foi revogado pelo Decreto nº 10.572. Desde então, a ciclofaixa opera sem um conjunto definido de regras, criando uma situação de incerteza quanto à regulamentação do espaço.
Curiosamente, a ciclofaixa ainda exibe 20 placas que informam as regras previstas pelo decreto revogado, sugerindo uma falta de clareza por parte da administração municipal sobre a vigência ou não de tais normas.
Dessas placas, 10 são específicas para a proibição do uso de patinetes elétricos entre 8h e 12h aos sábados, domingos e feriados, citando o número do decreto já revogado.
Além disso, há outras 10 placas, distribuídas em 5 pares de frente e verso, que proíbem a circulação de ciclomotores na ciclofaixa.
Essa contradição entre a revogação do decreto e a presença das placas indicativas das regras antigas aponta para um cenário onde, apesar das intenções de regulamentação, a prática parece divergir, deixando a ciclofaixa em um estado de desregulamentação aparente e contribuindo para a percepção de que as placas não passam de uma decoração, sem efetividade na orientação e fiscalização do uso do espaço.
Resolução nº 996/2023 do CONTRAN
Em 03 de julho de 2023, entrou em vigor a Resolução nº 996/2023 do Conselho Nacional de Trânsito (Contran), marcando um avanço significativo na regulamentação do uso de bicicletas elétricas, ciclomotores e outros veículos individuais autopropelidos em todo o Brasil. A intenção por trás desta resolução é esclarecer as diferenças entre os diversos tipos de veículos, oferecendo diretrizes claras para seu uso seguro e regulamentado.
De acordo com a nova resolução, os veículos são definidos da seguinte forma:
- Ciclomotor: Veículo de duas ou três rodas, equipado com um motor de até 50 cm³ e cuja velocidade máxima não excede 50 km/h.
- Bicicleta: Veículo de propulsão humana, com duas rodas, que não é considerado similar a motocicletas, motonetas ou ciclomotores para os efeitos do Código de Trânsito Brasileiro (CTB).
- Equipamentos de mobilidade individual autopropelidos: Inclui patinetes, skates e monociclos motorizados.
A Resolução nº 996/2023 do Contran estabelece diretrizes específicas relacionadas a características dos veículos, como potência do motor, velocidade máxima de fabricação, equipamentos obrigatórios, necessidade de registro e emplacamento, além de habilitação para condução.
Para as bicicletas elétricas, a norma determina que devem possuir um sistema que ative o motor apenas quando o condutor estiver pedalando, além de serem equipadas com indicador de velocidade, campainha, sinalização noturna dianteira e lateral, e espelhos retrovisores.
Em relação aos ciclomotores, motocicletas e motonetas, a norma destaca a obrigatoriedade de registro e emplacamento desses veículos.
Para a condução de ciclomotores, é obrigatória a obtenção da Autorização para Conduzir Ciclomotores (ACC) ou a Carteira Nacional de Habilitação (CNH) na categoria A.
Os equipamentos de mobilidade individual autopropelidos e as bicicletas elétricas devem seguir as mesmas regras de circulação aplicáveis às bicicletas convencionais, circulando em condições semelhantes.
A responsabilidade de regulamentar a circulação dos equipamentos de mobilidade individual autopropelidos, dos ciclomotores e das bicicletas elétricas fica a cargo dos órgãos locais de trânsito.
Na sexta-feira, 15, nossa equipe contatou a prefeitura para entender as medidas tomadas em Balneário Camboriú após a Resolução nº 996/2023 do CONTRAN ser implementada e questionou a ausência de fiscalização na ciclofaixa desde fevereiro de 2023, época da última blitz educativa promovida pelo BC Trânsito (conforme divulgado pela prefeitura). Não recebemos resposta, mas notamos que, pela primeira vez desde a aprovação da resolução, no domingo, 17, o BC Trânsito realizou uma operação de orientação e fiscalização de ciclomotores, alinhada à Resolução nº 996/2023 do CONTRAN.
Contudo, a situação na ciclofaixa da Atlântica parece inalterada. No final da tarde de sábado, 23, verificamos o fluxo na ciclofaixa da Avenida Atlântica e constatamos várias infrações:
- Ciclomotores circulando na ciclofaixa, apesar da proibição sinalizada por placas.
- Patinetes sendo utilizados por dois ocupantes simultaneamente.
- Pessoas usando patinetes enquanto sentadas em cadeiras de praia.
- Adultos transportando crianças em patinetes.
- Pedestres interrompendo o fluxo para tirar selfies na ciclofaixa.
- Ciclistas realizando manobras arriscadas, como empinar bicicletas.
- Pedestres atravessando em locais inapropriados, fora das faixas de segurança.
- Ciclistas adentrando abruptamente nas ciclofaixas, cortando a frente de outros usuários.
- Usuário de patinete levando cadeira de praia.
- Presença de ciclomotores nas calçadas.
Atlântica Inativa?
A superlotação da ciclofaixa em Balneário Camboriú é um problema reconhecido pelas autoridades locais, levando à criação do projeto “Atlântica Ativa” como uma medida paliativa. Iniciado após a inauguração da ciclofaixa em 2014, sob a gestão do então prefeito Edson Renato Dias Piriquito, o projeto foi uma parceria com a Associação de Ciclismo de Balneário Camboriú (ACBC). A proposta consistia em fechar uma faixa da Avenida Atlântica nos domingos pela manhã para transformá-la numa extensa área de lazer destinada a ciclistas, corredores, patinadores e pessoas que desejavam caminhar.
O governo subsequente, liderado por Fabricio, manteve o projeto em andamento. Contudo, em novembro de 2021, a prefeitura anunciou uma pausa no “Atlântica Ativa” devido ao aumento do movimento na cidade durante a temporada turística. A decisão pela paralisação temporária veio por recomendação do BC Trânsito, considerando o risco associado às atividades esportivas e o fechamento de uma das faixas da Avenida Atlântica, face ao crescimento do fluxo de pessoas nesse período. Desde então, o projeto não foi retomado.
Reurbanização da orla será a salvação?
A reurbanização da orla é frequentemente mencionada como uma solução potencial para os problemas enfrentados atualmente na ciclofaixa de Balneário Camboriú. O projeto da orla, concebido como um parque linear, prevê a adição de mais de 30 metros de largura. Dentro desse novo espaço, haverá uma ciclovia padronizada, com duas faixas – uma para cada direção, similar ao modelo atual. A diferença significativa é a inclusão de uma pista de corrida separada do espaço destinado às bicicletas.
Apesar dessas mudanças, o espaço dedicado à micromobilidade permanecerá praticamente o mesmo, com a única alteração sendo a remoção de pedestres e corredores da via destinada às bicicletas. Uma vez que o projeto não especifica a largura exata da ciclovia, resta a expectativa de que, pelo menos, as faixas sejam ampliadas e que normas específicas para sua utilização sejam estabelecidas.
Considerando que a obra de reurbanização pode se estender por até quatro anos, surge a questão sobre como a ciclofaixa da Atlântica será regulamentada durante esse período. Atualmente, a situação é marcada por uma falta de regras claras, deixando os usuários à mercê de um cenário onde prevalece a mentalidade de “cada um por si”.
Já que é cada um por si, cuidem-se.